Lições do coronavírus: ensino remoto emergencial não é EAD
● Texto publicado originalmente no Portal Desafios da Educação
A educação a distância é a pauta do momento. Com a suspensão das aulas presenciais devido à pandemia do novo coronavírus (Sars-CoV-2), um sem número de escolas e IES recorreu ao ensino remoto para tentar seguir o ano letivo.
A mudança exigiu adaptação rápida por parte dos professores, o que levanta debates e questionamentos: os professores estão preparados para lecionar além do formato tradicional? Para fazer um bom currículo de EAD, basta transferir o conteúdo do modelo presencial para o ambiente virtual?
Em primeiro lugar, é preciso entender a diferença entre ensino remoto de emergência e EAD.
“O ensino remoto praticado atualmente [na pandemia] assemelha-se a EAD apenas no que se refere a uma educação mediada pela tecnologia. Mas os princípios seguem sendo os mesmos da educação presencial”, afirma Renata Costa, professora de tecnologia do centro universitário Brazcubas.
Para Costa, a educação a distância pressupõe o apoio de tutores de forma atemporal, carga horária diluída em diferentes recursos midiáticos e atividades síncronas e assíncronas. E isso não é, exatamente, o que está sendo feito durante a quarentena.
“Não existia um plano de contingência educacional ou administrativo para casos assim. Muitas das entidades educacionais brasileiras não estavam preparadas tecnologicamente, nem teoricamente.”
Além de lecionar na Brazcubas, Renata Costa também é consultora de EAD. Ela afirma que que ainda há muita resistência das instituições e dos professores com a educação online.
Muitas vezes observamos o uso do ambiente virtual de aprendizagem [AVA ou LMS, na sigla em inglês] como um repositório de materiais, algo similar ao xerox. O AVA pode proporcionar muito mais.
Costa acrescenta: “A instituição deve incentivar o uso dos recursos interativos desse ambiente para que ele se torne uma extensão da sala física — aí, sim, podemos começar a pensar em EAD”.
Mais EAD e menos ensino remoto
O maior desafio desse “ensino remoto de emergência” recai sobre os educadores. Como adaptar os conteúdos, as dinâmicas de sala, as aulas expositivas e as avaliações — sem prejudicar o processo de aprendizagem? Como manter os alunos interessados e engajados? A tarefa é ainda mais complexa para aqueles que atuam em áreas distantes da tecnologia ou que lecionam para crianças.
Segundo Costa, é papel da instituição de ensino apoiar e instruir o professor. “Espera-se apoio técnico e regras objetivas e definidas para o formato do modelo remoto de aula”, comenta. Para a consultora, o amparo garante a confiança do docente e continuidade dos cursos.
Escolas e universidades costumam oferecer workshops de ambientação digital para suas equipes durante o ano letivo, mas é fundamental que, nesse período de quarentena, as os times de TI estejam integralmente disponíveis para auxiliar os funcionários com as atividades remotas.
As instituições também devem estimular a troca de conhecimentos digitais e metodologias entre os professores.

O ideal é tentar estabelecer um padrão no uso das plataformas de ensino online e das redes sociais pelo corpo docente. Roteiros de aula, exibições de vídeos autorais, lives em redes sociais, uso de softwares independentes e a comunicação com os alunos devem ser feitos de acordo com o posicionamento de cada instituição. É importante que as turmas também estejam cientes dos formatos adotados e possam dar feedbacks à IES.
4 Dicas: como otimizar e aproveitar as aulas
Dentro do combinado com as escolas e universidades, os professores podem utilizar estratégias para tornar o conteúdo mais interessante e garantir a proximidade com os estudantes.
1) Criar um canal no YouTube: Ainda que seja possível compartilhar vídeos no LMS da instituição, pode ser válido abrir uma conta no YouTube. O envio dos vídeos costuma ser mais simples e veloz, e a plataforma permite que os alunos se inscrevam no canal, recebendo notificações sobre novas aulas todas as vezes que a acessarem.
2) Diversificar os materiais: Cada pessoa aprende de uma maneira diferente. O truque é apostar em pelo menos três formatos para alcançar o maior número possível de alunos. Ao invés de publicar dois textos em sequência, é recomendável mesclar com conteúdos em vídeo e em áudio, por exemplo.
3) Manter o espírito de grupo: Com o isolamento social, as turmas estão afastadas. Preservar a sensação de pertencimento a um grupo aumenta o engajamento e permite que os estudantes esclareçam dúvidas entre si. É possível criar um grupo da disciplina em aplicativos de mensagens instantâneas, realizar reuniões por videoconferência e lives nas redes sociais, sempre incentivando os comentários.
4) Aproximar conteúdo e realidade: Estabelecer ligações entre o conteúdo aprendido em aula e o cenário de isolamento social gera identificação. A dica é explorar o tema da pandemia sempre pelo lado positivo, propondo soluções e reflexões para o futuro e proporcionando que os alunos tragam as suas experiências para o ambiente estudantil.
A educação a distância ganhou protagonismo em um momento de crise, não há dúvidas. Mas, para a professora Renata Costa, podemos ressignificar esse período construindo novas perspectivas para a educação brasileira.
No último ano, 1,5 milhão de alunos participaram de cursos superior no formato EAD no Brasil, de acordo com o censo da Abed, a Associação Brasileira de Educação a Distância. Esse número será acachapante em 2020, considerando o cenário atual.
“Se antes alguns profissionais acreditavam que modelo online não impactaria o quadro educacional em que estamos inseridos, agora eles precisam repensar essa certeza”, afirma Costa.
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